terça-feira, 4 de maio de 2010

Francisco

Tinha decidido fazer-te um retrato, lembras-te?
Pois bem, Francisco!
És moreno, pele bronzeada, olhos verdes como a água do mar, cabelos de andorinha. Dezassete anos. És alto, 1,80m. Como bom conselheiro, tens sempre uma palavra amiga, a palavra certa para cada ocasião. Dizes o que tens a dizer, sempre. Não gostas de meias-palavras nem de mentiras. Dizes que "a mentira tem perna curta" e "a verdade acima de tudo, doa a quem doer"! Tens um bonito sorriso, uma voz melodiosa, cantante. Um olhar doce. Gestos harmoniosos. Mas, quando te chega a pimenta ao nariz, viras-te do avesso. Verdade e justiça são as tuas palavras de ordem. Filho de pais separados, uma mãe mais ausente que presente, um pai meio-louco, cresceste um pouco entregue a ti e à tua avó materna. O teu irmão, mais velho três anos, estuda em Coimbra e vive num mundo à parte. O teu sonho é seguires psicologia, a tua mãe acha que estás a pensar tirar um curso com muitas vagas no desemprego. Não tens namorada, neste momento, mas já tiveste. És o meu melhor amigo, o meu conselheiro, o meu confidente. Sempre que preciso de ti, tu apareces. Ainda bem que estás aqui! Abraça-me e fala-me baixinho, diz-me que a morte não existe, que o meu avô foi para outro lugar, para um local bem melhor do que este. Um lugar onde as pessoas são boas, onde não há fome nem injustiça. Diz-me que ele encontrou amigos, que está bem e feliz, embora com saudades nossas. Diz-me que ele já não sente dores.
Amanhã é o funeral do meu avô. Eu nunca fui a um funeral. Vai comigo, leva-me pela mão, não me largues nunca. Só quero dizer-lhe adeus.

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