Depois do jantar, aninhei-me
de novo no colo do meu pai. A Francisca encostou-se à minha mãe. Estávamos
prontas, Francisco, para ouvir, então, a mais bonita história do mundo!
Estava
no café com um grupo de amigos a beber cerveja e a comer tremoços. Ríamos com
os mil disparates contados à vez, as centenas de anedotas... De repente, olhei
para a porta, entrava um grupo de jovens, raparigas e rapazes, estudantes, pela
certa... E os meus olhos esvoaçantes pousaram na menina mais bonita do grupo,
do mundo, do universo...
-
Não é para ti! – disse-me, batendo no meu ombro, o meu colega do lado.
-
É que não é mesmo! – insistiu o meu primo, vendo o meu olhar pregado no rosto
daquela princesa. É que se era verdade que existiam princesas bonitas, ali
estava a prova: aquela menina era uma princesa, era uma princesa das histórias
que li e ouvi, quando era garoto...
Sentaram-se
do lado oposto, por sorte, ela ficara virada para mim, procurava-lhe os olhos
grandes, mas eles voejavam de colega para colega, para o empregado que estava a
atender o grupo, para o livro que tinha entre as mãos esguias... E nunca, mas
nunca, descansaram sobre o meu olhar suplicante que chamava, chamava...
Os
meus amigos riam-se e diziam qualquer coisa, mas tudo me soava, vindo de muito
longe... Por fim, abanaram-me:
-
Acorda, homem, parece que viste uma alma do outro mundo!
-
É deste mundo e está mesmo ali, mas parece-me completamente inatingível...
Chamaram
o empregado, pagaram e levantaram-se. Ergui-me também, atirei com um paguem a
minha parte, isto deve chegar e arremessei umas quantas moedas para cima da
mesa...
Queria
seguir o grupo, não queria perdê-la de vista... Meti-me no carro e rezei para
que não se metessem por portas travessas, por onde eu não poderia passar de
carro. Perdi-lhes o rasto, meteram-se por uma viela de sentido proibido, e tive
de ir dar a volta... Apanhei-os a entrar no Parque da cidade, estacionei e
galguei os degraus... Lá ia ela a conversar com uma amiga gordinha, rodeada de
uns tantos colegas. Mas, os meus olhos não se soltavam daquela silhueta esbelta
e loura...
Entraram
num café onde os estudantes faziam uns bailes para angariar fundos para uma
viagem de finalistas. Comprei o bilhete e segui o grupo animado que se juntava
a uns tantos amigos... Entre beijinhos e abraços, pulos, risos contidos,
gargalhadas sonoras, lá estava a minha deusa sorridente, a minha princesa...
Olhei
o ambiente e procurei um lugar de onde a pudesse observar sem ser visto. E ali
fiquei a olhá-la completamente extasiado: o corpo perfeito, os gestos, o cabelo
dourado, o rosto bonito, o riso aberto,
o sorriso luminoso, os olhos grandes e verdes ornados de longas pestanas...
A
música era ensurdecedora, mas eu não a ouvia, só adivinhava o riso dela.
Por
fim, aproximei-me e convidei-a para dançar. Nunca tinha ouvido um não tão
sonoro! E insisti e insisti e ela nem me olhava e bombardeava-me com uma quantidade louca
de recusas. Nunca um não me tinha soado tão bem! Que voz meiga! Que voz
sensual! Que voz melodiosa! Era a voz mais bonita que tinha ouvido!
Eu
tinha de a ter nos meus braços, ela tinha de me conceder uma dança... Mas, ela
já nem me deixava perguntar, respondia logo com um não rotundo!
Tinha
de me fazer notar, ela dizia não sem sequer me olhar: coloquei-me de joelhos à
sua frente, segurei-lhe a mão, que ela procurava tirar, e pedi-lhe pela enésima
vez que dançasse comigo. Recusou, riu nervosamente. Toda a gente, à nossa
volta, parou de dançar para ver aquele
inusitado espectáculo. Envergonhada, tentou sair dali e eu segui-a de gatas
pela sala, pedindo insistentemente uma dança, só uma...
-
Deixa-me em paz! – dizia ela, já impaciente.
-Oh,
pai, não acredito, tu fizeste mesmo isso? – perguntou a Francisca incrédula.
-
E a mãe, a mãe foi dançar contigo, pai? Foste, mãe? – perguntava eu, curiosa e
ansiosa, olhando ora para um ora para o outro.
-
Vá lá, Rita, deixa o pai contar o resto! – pediu a minha maninha, que antes me
chamou bebé, mas agora também estava entusiasmada com a história dos nossos
pais.
-
A vossa mãe voltou a recusar...
Ela
sacudia-me nervosamente e irritada e eu continuava a andar de gatas atrás
dela...
-
Que vergonha, pai! – exclamava a Francisca.
-
Que bonito! – dizia eu.
Entretanto,
toda a sala estava a olhar para nós: eu, de gatas, a andar atrás dela ou, de
joelhos, a pedir-lhe uma dança... De repente, a música parou e todos desataram
a gritar:
-
Dança, dança, dança...
Levantei-me,
enlacei-a pela cintura, puxei-a para mim e ela deixou-se levar... Ah!
Esqueci-me de vos dizer, mas tinha combinado com o rapazinho que punha os
discos, a música que ele deveria pôr, quando a vossa mãe aceitasse, por fim,
dançar comigo...
-
A sorte do vosso pai foi não ser um pé de chumbo! – disse a minha mãe a
sorrir.
-
Não é uma história linda, Francisco!
Obrigado por comentar lá no blog.
ResponderEliminarHá homens perseverantes.
ResponderEliminarSe assim não fosse, não conseguiriam as coisas...
A história é linda, gostei de a ler.
Rita, tem um bom resto de domingo e boa semana.
Beijo.