O Trabalho de Português está quase pronto. Assaltámos os caixotes de apontamentos e de fotocópias da minha mãe, do tempo dela da Faculdade. Ela contou-me que estudara Os Lusíadas e a obra de Fernando Pessoa...
Que sorte, Francisco! Havia tanto material. Espalhámos tudo na garagem. Quem não achou graça nenhuma foi o senhor raiz quadrada! Ia-lhe dando um ataque, uma coisinha má, logo que entrou na garagem e viu aquele festival de papéis e livros e sebentas por todo o lado, e nós sentados no chão, qual ilhas, rodeados por um mar de papelada, velha e encardida, por todos os lados, e ainda os portáteis, canetas, lápis... canecas com chá, pratinhos com biscoitos e línguas-de-gato.
Era quinta-feira, a Francisca telefonou a dizer que chegava à tarde. Com um pouco de sorte chega a tempo de conhecer a Linda. A minha mãe ainda não viu a Linda, só chega lá para o fim da tarde. O meu pai ficou de tal modo fulo com o espalhafato que fizemos na sua querida garagem que nem nos olhou, só disse:
- Quero esta balbúrdia toda arrumadinha, meninos!
Olhei para o Gonçalo e desatámos a rir, ele não viu de certeza a Linda, aliás, ele não viu ninguém...
Pegámos no material escolhido e nos portáteis e levámos tudo para o escritório. Colocámos o restante material nos caixotes e deixámos a garagem de novo em ordem, como o senhor meu pai gosta.
Estávamos já no escritório a trabalhar, era preciso inserir os novos dados descobertos, quando de repente soou a voz doce da minha mãe:
- Então, como vai o trabalho, precisam de ajuda?
Levantámos a cabeça e encostado à ombreira da porta, estava o mais belo sorriso do mundo nos maiores olhos de esperança que conheço.
- Linda, apresento-te a minha mãe!
- Olá Linda, muito prazer em conhecer-te! Viva Gonçalo! Então, André e Margarida? Como vai esse trabalho? Falta muito?
- Estamos a ultimar, a enriquecê-lo com alguns dados do tempo dos dinossauros que encontrámos nas catacumbas do senhor raiz cúbica...
- Hummm! Raiz cúbica... estou a ver que se chateou convosco!
- Tudo sob controlo - disse o Gonçalo - já arrumámos tudinho.
- Mãe, a Francisca vem hoje!
- Ora bem, que tal uns moranguinhos com iogurte? Comprei-os agora, se souberem como cheiram...
E desapareceu rumo à cozinha.
- Rita, a tua mãe é muito bonita, és parecida com ela! Tem cá uns olhos!
- Chega de conversa, toca a trabalhar.
Não, Francisco, a minha mãe não ficou impressionada com a figura da Linda, quer dizer, pelo menos, não o deu a entender.
Estávamos a comer os morangos, quando irrompeu pela cozinha a minha mana:
- Também quero! Viva pessoal, tudo bem?
Abraçou e beijou a minha mãe que lhe esticou a taça que acabara de preparar.
- Bem, tu deves ser a Linda! Mulher, que se passa contigo? O Carnaval não passou já ou sou eu que já perdi o tino? Adoro esse estilo, vai ser um sucesso no próximo baile... não achas, Rita! Pareceremos todos saídos de um qualquer filme de terror...
Eu fiquei de boca e olhos enormemente abertos a olhar a cara da Linda. O Gonçalo confirmava e sustinha, como podia, o riso, prestes a estalar. O André olhava-nos a todos entre divertido e preocupado. Se a Linda se passa, pensava, vai ser um Deus nos acuda. A Margarida engasgou-se e tossia aflita.
Para ajudar à festa, surge o meu pai a dizer que a cadela tinha feito umas escavações, que os buracos estavam cheios de água, que tínhamos de ter cuidado para não nos atolarmos no lamaçal... Nisto, encara com a Linda e disse com a cara mais pesarosa do mundo:
- Ó Deus, demasiado tarde, a vossa amiga já caiu no lodo!
E foi um estardalhaço de gargalhadas, a Linda desatou a rir e nós ficámos uns momentos sem saber se devíamos rir também. E rimos. E olhávamos uns para os outros e ríamos cada vez mais. Por fim, entre gargalhadas:
- Rita, a tua família é extraordinária, vocês são o máximo, nunca me ri tanto na minha vida.
Cada vez que nos lembrávamos da cara do meu pai, não aguentávamos, a Linda imitava a Francisca e ria, ria, ria...
- Linda, vamos destapar a piscina no Sábado, queres passar o fim-de-semana connosco? - perguntou a minha doce maninha. - Margarida podes vir também.
Percebi logo a estratégia da Francisca.
O André segredou-me um vão ficar com a água da piscina toda suja. Cala-te, atirei-lhe. Olha, só o duche antes do banho não chega tornou ele, tens de a passar por várias águas, insistia. Pára com isso, sussurrei-lhe, já zangada.
Apitaram lá fora, eram os pais dos meus colegas.
- Conta comigo, Francisca, no Sábado cá estarei.
Foram-se. A Francisca piscou-me o olho e subiu para desfazer a mala...
Boa tarde Rita
ResponderEliminarSem dúvida que é um "GRITO",muito bem aplicado.
Gostei e tomei a liberdade de aderir-
Um bom fim de semana
beijinho
Mas que grande animação.
ResponderEliminarAinda bem que a Linda parece ser capaz de se rir de si própria...
Um beijo, querida amiga.