quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Conheceu-o no Facebook

Francisco, esta gente anda toda louca!
Uma colega minha, a Telma, tem uma irmã de treze anos que conheceu um rapaz no Facebook. Ele é do Porto, isto é, ele disse-lhe que era do Porto. Mas, pode não ser!
Ele, na foto de perfil, aparenta ter 18, 19 anos, tem olhos azuis, diz medir 1.80m, tem cabelo escuro e disse à Vitória, a irmã da minha colega, que estava apaixonado por ela. "Conheceram-se" em Outubro, falavam todos os dias no chat. Depois trocaram os números de telemóvel e passaram a enviar mensagens a toda a hora. 
A Vitória convidou-o para vir ter com ela um dia para se conhecerem, mas ele disse que não podia, pois trabalhava e estudava. A "coisa" ficou por ali, continuaram as conversas no chat, as mensagens e os telefonemas.
A garota era boa aluna, mas depois de conhecer o Pedro, parece ser este o nome do rapaz, as notas começaram a baixar, a baixar... Ela começou a esconder os testes com más notas, a não dar os recados da DT à mãe, começou até a faltar às aulas para estar a enviar mensagens ao Pedro do seu coração.
As notas saíram, ela teve 7 negativas. 
A mãe confiava na miúda, ela tinha sido sempre tão certinha, tão educada, uma jóia de menina! Na reunião de Encarregados de Educação, a mãe ficou a par das faltas, das cartas enviadas pela DT que nunca chegaram, dos recados na caderneta que nunca viu nem leu... A senhora ficou para não viver! 
Os pais ralharam com a filha, puseram-na de castigo, tiraram-lhe o telemóvel, o computador... e incumbiram a Telma de andar em cima dela. Nos intervalos, a Telma não podia tirar os olhos de cima da Vitória e tinha de se certificar que ela entrava mesmo na sala de aula. A Telma não estava a gostar nada desse papel e não queria que a irmã a visse como o seu inimigo público número 1 e pediu-nos, a mim e a mais dois colegas, que a ajudássemos a vigiar a irmã, sem darmos muitos nas vistas, claro. A mãe começou a ir assiduamente à escola falar com a DT e parecia que a garota estava a melhorar. 
Mas, afinal, o portar-se bem, o não ter ficado grandemente chateada com a falta do telemóvel e do computador era só fachada. Ela andava a remoer uma vingançazinha! Continuava a manter contacto com o Pedro através dos telemóveis das amigas; quando a mãe não estava em casa, telefonava-lhe do telefone fixo e acedia ao Facebook através do computador da Telma ou de outro que estivesse disponível. 
Hoje, a Telma contou-me que a irmã fugira para o Porto na passada sexta-feira, depois das aulas da manhã. Esteve na aula com a DT (se ela faltasse, a professora telefonaria logo à mãe) e depois, meteu-se no comboio e, ala que se faz tarde, rumou ao Porto. 
Às seis e meia, ela deveria estar em casa, não chegou, às sete horas também não... A Telma e a mãe desataram a telefonar para todas as colegas da Vitória. O telemóvel dela não estava no lugar onde a mãe o guardou. Telefonaram-lhe. Não atendeu. Telefonaram-lhe um cento de vezes. Nada. A melhor amiga  dela, a Vanessa, disse que talvez soubesse onde  estava a Vitória. Que lhe ia telefonar e que daria notícias, logo que soubesse alguma coisa de concreto.
O pai, quando chegou, foi à polícia participar a fuga da filha e ficou toda a gente a aguardar notícias. 
A Vanessa conseguiu contactar com a Vitória, soube que ela tinha acabado de chegar à estação do Porto. Disse-lhe que não saísse de lá, pois a polícia já andava à procura dela... A polícia daqui comunicou para lá... E eis que tudo correu bem e a Vitória voltou sã e salva para casa.
Agora, Francisco, ouve bem isto:
A Vitória ia ter com um indivíduo que nunca viu mais gordo. A semana passada, na escola houve uma série de conferências sobre a violência, e os perigos da Internet foram abordados. Ela estava mais do que alertada e mete-se num comboio para ir ter com alguém que "conheceu" na Net!
A polícia disse que ela teve muita sorte, pois a esta hora já poderia estar do lado de lá da fronteira numa casa de alterne ou numa situação muito pior... Através do endereço que a Vitória tinha com a morada onde ela e o indivíduo se encontrariam, a polícia apanhou o sujeito... Não tem a idade que disse ter, a foto do Facebook não é dele... Tudo mentira! Trata-se de um pedófilo! Vê lá na alhada que a miúda se poderia ter metido.
Na escola, ela foi contar à DT o que tinha acontecido e  rematou a conversa, dizendo, "agora já todos sabem do que sou capaz de fazer, fugi uma vez, posso fugir mais duas ou três e até desaparecer. Eles que tenham muito cuidado comigo". A DT parece que lhe vai arranjar umas consultas de psicologia. A Telma anda de rastos, nem parece a mesma, só diz:
- O que é que deu à minha irmã. Ela não era nada assim!
Pronto, Francisco, anda ou não anda tudo louco?

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Conferências, roubos, sermões

Olá Francisco!

Estás contente por me veres? Eu também estou feliz por estar aqui contigo.
Como vão as aulas? Bem. Os meus colegas? Ah, esses têm dias: dias em que se portam mais ou menos, dias em que se portam pior, dias em que nem vale a pena falar... Os professores? Uns mais desanimados; outros vão trabalhando com picos de humor, altos e baixos, estás a ver?; outros nada os abala ou parece não abalar, aparecem sempre com o seu mais belo sorriso e fazem das tripas coração para ver se tudo dá certo: exasperam, quando não respondemos acertadamente; rejubilam, quando estamos dentro da matéria e quando "fazemos bonito", como diz a Victória, uma colega brasileira que entrou há pouco tempo para a turma. 
A minha turma continua a ser mais concorrida, ao nível de chegadas e partidas do que o terminal do aeroporto de Lisboa, como dizia a nossa DT o ano passado. Quanto a isso, nada mudou: há sempre alguém que se foi embora, há sempre alguém que acabou de chegar.
Novidades? A DT pregou um valente raspanete aos meninos "armados aos cucos" e às "meninas metidas a bestas", segundo a nova colega. 
O Paulo decidiu roubar os telemóveis a todos os incautos e fazê-los desaparecer, foi um ar que lhes deu. A par dos telemóveis, foi dinheiro, ipads, consolas, óculos de sol... Tudo o que caiu na rede do Paulo era peixe.
Como aconteceu uma coisa destas?
Francisco, a professora já tinha avisado que não levássemos coisas muito valiosas para as aulas, que levássemos telemóveis velhos, só para estarmos contactáveis, os outros valores eram para ficar em casa. O pessoal adora desfilar com o seu iphone novo, o seu ipad do último modelo, a consola portátil mais fixe do mundo e dos arredores, o relógio da marca x... Enfim, chegavam a troçar daqueles que não levavam para a escola os seus objectos de maior valor.
O Paulo, quando era chamado ao quadro, levava todo o "arsenal" consigo: telemóvel e ipad pendurados no pescoço, consola... Algumas coisas, colocava-as na secretária da professora. Depois, acabado o exercício, recolhia tudo e ia para o seu lugar. Ele lá sabia porquê.
Fomos à Biblioteca assistir a uma conferência sobre a violência, deixámos tudo na sala, a professora fechou a porta à chave e levou-a consigo. A palestra duraria 45 minutos, depois regressaríamos à sala, porque a aula era de 90 minutos.
Não sei como, o Paulo saiu da Biblioteca, entrou na sala e limpou tudo o que havia de valor. Ninguém deu pela sua saída nem entrada. Quando regressámos à sala, foi a professora quem abriu a porta... Uma vez, sentados, estivemos a conversar um pouco sobre a conferência e... de repente... começou tudo a queixar-se: uns que lhe faltava dinheiro, outros não tinham os telemóveis... Faltava isto e aquilo. A professora começou a dizer que era impossível faltar alguma coisa, pois tinha sido ela a fechar e a abrir a porta e toda a gente viu e houve até quem confirmasse... Gerou-se uma confusão dos diabos, começaram a desconfiar uns dos outros, a apontar a, b e c. A professora pediu a todos que se sentassem e pregou-nos um sermão daqueles de "caixão à cova". Tudo apontava para o Paulo, houve até quem o visse sair da Biblioteca, tendo regressado pouco depois. Ele desculpou-se, dizendo que fora à casa-de-banho. A professora perguntou-lhe "com ordem de quem é que saíste da palestra?" Ele embatucou. Os olhos da professora pareciam querer sair-lhe das órbitas, enormes, verdíssimos. Estava tudo em silêncio, só se ouvia a voz da professora. Ela estava zangada, zangadíssima, e eu, Francisco, vê tu, a pensar, mesmo a ralhar, mesmo quase a gritar connosco, a professora tem uma voz lindíssima, mais bonita só a da minha mãe...
Agora, Francisco, vais ficar pasmado com o que aconteceu. A professora dirigiu-se ao Paulo e disse-lhe:
- Tens dez minutos para entregar tudo o que levaste daqui, depois, chamo a polícia.
Nós pensámos que ele ia barafustar e dizer que não tinha nada a ver com o desaparecimento de coisa nenhuma. Mas não! Ele levantou-se, saiu da sala. Pensámos, vai-se embora e não volta...
A professora começou a dar aula como se nada tivesse acontecido.
Bateram à porta, a professora olhou para o relógio, sorriu, foi abrir a porta. Era o Paulo. Trazia um saco com todos os haveres dos colegas. Despejou tudo na secretária da professora. Tudo voltou para os seus donos. Faltavam apenas alguns telemóveis. A professora olhou para ele com aquele olhar interrogativo. Ele foi ao caixote do lixo e trouxe os objectos mais humildes. Entregou-os. Chegou a hora da saída. A professora, mais uma vez, falou que aquelas "coisas caras" eram para ficar em casa. Alguns e algumas quiseram argumentar com a professora... Mas esta rematou, dizendo que da próxima vez que tal acontecesse não moveria um dedo, uma palha, para que lhes fossem restituídos os seus pertences. Saímos e a professora fez sinal ao Paulo. O Paulo ficou para trás, nós fomos para a aula de Matemática. O Paulo chegou 15 minutos atrasado e estava com cara de quem tinha estado a chorar...